Mariana Hanssen
3 min readNov 23, 2022

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Jaipur

São 5h30 da manhã. Estamos na estação de trem de New Delhi, e é como a Sé às 6 da tarde vezes mil. Pegamos o trem em direção à Jaipur, capital do Rajastão (região no noroeste do país).

Cada etapa da viagem não é simples, quando se viaja por conta própria. Vai desde aprender à reconhecer notas falsas, passando por encontrar o guichê de passagens para turistas (é tão complicado comprar passagens que existem guichês específicos para estrangeiros, e ainda assim foi complicado), até ter a certeza que a água que você vai tomar não vai destruir seu sistema digestivo ocidental.

Jaipur é furacão. Labirinto de gente e de tuktuk. Não vemos muitos turistas, o pós Covid se mostra duro por aqui, e isso reinforça o desespero das pessoas que trabalham com turismo e comércio. O clima é de desespero.

Decidimos ir comer em um pequeno restaurante próximo ao “City Palace" — o palácio de um antigo Majahara. Por ser noite, seria seguro, não?

O palácio em si é cercado por portões com seguranças, e apenas carros que custam casas passam esses muros.

No que há em torno, pouca iluminação. Das poucas pessoas na rua, olhares desconfiados crescem em nossa direção. Não era nosso lugar.

Imaginei uma versão Indiana da icônica foto no bairro do Morumbi em São Paulo.

Paramos um tuktuk para voltar pra casa — as ruas desertas transpiravam tensão.

O baixa guarda foi passageiro. Passamos em uma rua com muitos comércios locais abertos e gente gritante, se permite o néologismo.

Um homem de 50 anos eu diria, bloqueia nosso caminho, olho no fundo dos olhos de Grégoire, e pergunta: “por que vocês (ocidentais) não falam com a gente ?”. O homem se mostrava nervoso — talvez bêbado. Grégoire tenta responder mas o homem se mostra cada vez mais impaciente. Um círculo de pessoas do bairro se forma se forma em volta de nós — crianças, idosos, bêbados, sóbrios.

Naquele momento, não havia saída dialógoca possível: transformou-se de repente em um teatro para tentar regular dinâmicas de poder das quais não podíamos fugir. Eu não dizia nada. Não sabia — e ainda não sei- quais eram as respostas às perguntas desse homem.

Entendemos que viajar na Índia é também (e principalmente) olhar para si mesmo e enxergar o mundo de outra forma.

A noite difícil se mostra solar no café da manhã. Compartilhamos chaï com uma família suiço-marroquina que se hospedava no mesmo lugar que nós.

A troca acalmou o turbilhão que explodia dentro de nós. É muito difícil viajar no mar do desconhecido sem poder passear na experiência de outras pessoas. Poder dialogar sobre o que a gente estava vivendo foi um alívio coletivo — o caminho podia seguir em paz.

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